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INSTRUÇÃO
As questões de 1 a 5 relacionam-se com o texto abaixo. Leia atentamente
todo o texto antes de responder a elas.
FALAR E ESCREVER BEM
Mal amparado por escolas que evadem qualquer menção à análise sintática, o
brasileiro nem sempre sabe onde buscar régua e compasso para disciplinar a língua
que fala. O português é uma entidade dinâmica, continuamente alterada e
enriquecida por novas gírias, expressões, palavras importadas. Mas essa fluidez não
faz dela um território sem leis.
As gramáticas normativas cumprem um bom papel no esclarecimento de dúvidas
sobre o que é ou não correto na escrita. A fala, porém, admite muitas construções
que seriam aberrantes na página impressa. “Vou no médico”, por exemplo, é a forma
mais comum em conversas informais, ainda que não seja a forma mais recomendada
pela norma culta da língua. O que é preciso é achar o equilíbrio, inclusive nas
diferenças de registro: um adolescente não pode empregar com os avós os mesmos
termos que utiliza nas baladas com sua turma.
Nas últimas décadas, por força da urbanização, o fosso que separava a fala culta
da “popular” tem se estreitado. Em meados do século passado, por exemplo, “a
gente” não era aceito como um equivalente a “nós”. Hoje é uma forma perfeitamente
apropriada. “Nós” ganhou certo ar formal. “De terno e gravata, a reunião é conosco.
De bermuda e chinelo, pode falar com a gente mesmo”, brinca o professor de
português Sérgio Nogueira. “A gente fomos”, é claro, continua sendo o que sempre
foi: um erro. Aberrações como essa agridem tanto os ouvidos como a natureza da
língua.
É saudável manter distância dos modismos linguísticos que logo viram vícios,
além de se observar uma outra variável em jogo: a elegância. Um exemplo ilustrativo
é o chamado gerundismo. Não é que “vou estar enviando” seja errado do ponto de
vista gramatical. Mas o transbordamento de verbos ofende a frase, que diria a
mesma coisa com um “enviarei” ou, na fala, “vou enviar”.
O gerundismo pegou porque alguns creem que essa é uma forma sofisticada de
falar. Outros, com o mesmo propósito, recorrem ao bacharelismo, confundindo
afetação com riqueza vocabular. Nesse caso, tem-se medo de ser simples. Trata-se
de um medo infundado: ser simples é ser elegante. Dizer mais com menos é o ideal.
E “falar difícil” é andar na contramão do bom-senso.
É de bom-tom, ainda, manter os ouvidos afinados com os modos de expressão
correntes. À parte alguns elitistas que acusam a televisão de “empobrecer” a
linguagem, o veículo faz um excelente registro da boa fala contemporânea, ao
eliminar as peculiaridades regionais e etárias da língua. A qualidade dramática das
novelas da Globo pode oscilar, mas, em geral, seu texto atinge uma conciliação
excelente de coloquialismo e correção. O recurso a gírias regionais, expressões
grosseiras e erros de português é, sim, admissível – mas com parcimônia. “Nesses
casos, deve-se deixar claro para o espectador que aquele linguajar é uma licença da
ficção para retratar um tipo popular” diz o noveleiro Sílvio de Abreu. Em Passione, há
40 um desses tipos peculiares – e cômicos: Candê, a verdureira suburbana vivida por
Vera Holtz, que gosta de chutar a gramática e diz frases como ―fazem dois dias que
não vejo ela”. “O que interessa é que as personagens falem de maneira natural, com
a correção possível, mas sem afetação” diz Abreu.
VEJA, 11/08/2010, p.94-101. (Texto adaptado)