Processando...

Questões comentadas Polícia Civil-DF de Português | 36707

#36707
Banca
FUNIVERSA
Matéria
Português
Concurso
Polícia Civil-DF
Tipo
Múltipla escolha
difícil

(1,0) 1 - 

Frei Simão era um frade da ordem dos Beneditinos.

Tinha, quando morreu, cinquenta anos em aparência, mas

na realidade trinta e oito. A causa dessa velhice prematura

derivava da que o levou ao claustro na idade de trinta

anos, e, tanto quanto se pode saber por uns fragmentos de

memórias que ele deixou, a causa era justa.

Era frei Simão de caráter taciturno e desconfiado.

Passava dias inteiros na sua cela, donde apenas saía na

hora do refeitório e dos ofícios divinos. Não contava

amizade alguma no convento, porque não era possível

entreter com ele os preliminares que fundam e consolidam

as afeições.

Em um convento, onde a comunhão das almas deve

ser mais pronta e mais profunda, frei Simão parecia fugir à

regra geral. Um dos noviços pôs-lhe alcunha de urso, que

ficou, mas só entre os noviços, bem entendido. Os frades

professores, esses, apesar do desgosto que o gênio

solitário de frei Simão lhes inspirava, sentiam por ele certo

respeito e admiração.

Um dia anuncia-se que frei Simão adoecera

gravemente. Chamaram-se os socorros e prestaram ao

enfermo todos os cuidados necessários. A moléstia era

mortal; depois de cinco dias frei Simão expirou.

Durante estes cinco dias de moléstia, a cela de frei

Simão esteve cheia de frades. Frei Simão não disse uma

palavra durante esses cinco dias; só no último, quando se

aproximava do minuto fatal, sentou-se no leito, fez

chamar-se mais perto o abade, e disse-lhe ao ouvido com

voz sufocada e em tom estranho:

— Morro odiando a humanidade!

O abade recuou até a parede ao ouvir estas

palavras, e no tom em que foram ditas. Quanto a frei

Simão, caiu sobre o travesseiro e passou à eternidade.

Depois de feitas ao irmão finado as honras que lhe

deviam, a comunidade perguntou ao seu chefe que

palavras ouvira tão sinistras que o assustaram. O abade

referiu-as persignando-se. Mas os frades não viram nessas

palavras senão um segredo do passado, sem dúvida

importante, mas não tal que pudesse lançar o terror no

espírito do abade. Este explicou-lhes a ideia que tivera

quando ouviu as palavras de frei Simão, no tom em que

foram ditas, e acompanhadas do olhar com que o

fulminou: acreditara que frei Simão tivesse doudo; mais

ainda, que tivesse entrado já doudo para a ordem. Os

hábitos da solidão e da taciturnidade a que se voltara o

frade pareciam sintomas de uma alienação mental de

caráter brando e pacífico; mas durante oito anos parecia

impossível aos frades que frei Simão não tivesse um dia

revelado de modo positivo a sua loucura; objetaram isso

ao abade, mas este persistia na sua crença.

 

 

 

Machado de Assis. Frei Simão. In: Contos Fluminenses.Rio de Janeiro: Globo, 1997.

Infere-se do texto que

Comentários da questão