Texto IV, para responder às questões de 7 a 10.
Certa vez, um homem, extremamente invejoso de
seu vizinho, recebeu a visita de uma fada, que lhe ofereceu a
chance de realizar um desejo. “Você pode pedir o que quiser,
desde que seu vizinho receba a mesma coisa, em dobro”,
sentenciou. O invejoso respondeu, então, que queria que ela
lhe arrancasse um olho. Moral da história: o prazer de ver o
outro se prejudicar prevaleceu sobre qualquer vontade.
Assim como o ciúme é querer manter o que se tem e
a cobiça é desejar aquilo que não lhe pertence, a inveja é
não querer que o outro tenha. O mais renegado dos sete
pecados capitais é uma emoção inerente à condição
humana, por mais difícil que seja confessá-la. Afinal, todo
mundo, em algum momento da vida, já sentiu vontade de ser
como alguém. Há até um lugar no cérebro reservado para a
inveja. Pela primeira vez, uma pesquisa científica mostra
onde são processados na mente humana ela e o
shadenfreude — palavra alemã que dá nome ao sentimento
de prazer que o invejoso experimenta, ao presenciar o
infortúnio do invejado.
O neurocientista japonês Hidehiko Takahashi
identificou onde os sentimentos são processados no cérebro.
Ao sentir inveja, a região do córtex singulado anterior é
ativada. O interessante é notar que é nesse mesmo local que
a dor física se processa. “A inveja é uma emoção dolorosa”,
afirma Takahashi. O shadenfreude, por sua vez, se
estabelece no estriado ventral, exatamente onde se processa
a sensação de prazer. “O invejoso fica realizado com a
desgraça do invejado”, diz o pesquisador. “Trata-se de um
sentimento caracterizado pela sensação de inferioridade”,
explica o neurocientista Takahashi. “Quando há essa
sensação, é porque houve comparação, e a pessoa perdeu”.
Além da insegurança, são características comuns
aos invejosos a baixa autoestima, o sentimento de
incapacidade e a sensação de injustiça. “Pessoas bem
resolvidas e esclarecidas tendem a ter menos inveja”, diz o
psiquiatra José Thomé, da Associação Brasileira de
Psiquiatria.
Em casos patológicos, que, segundo especialistas,
são mais comuns do que se imagina, quem sofre do mal é
capaz de caluniar, perseguir, e, em casos mais extremos,
desejar a morte do invejado. Há, também, os que somatizam.
Nessas situações, podem apresentar quadro depressivo,
autodestrutivo, agressividade e tendências suicidas. O
psiquiatra Thomé acredita que, salvo os casos patológicos,
as pessoas têm livre-arbítrio para viver ou eliminar a inveja.
“É um sentimento muito primitivo, que deve ser trabalhado”.
Quando a pessoa consegue fazer que o sentimento,
em tese negativo, impulsione ações positivas, ela o
transforma no que os especialistas chamam de inveja
criativa. A psicóloga Sueli, da USP, assina embaixo. “É
importante eliminar os sentimentos de inferioridade, a baixa
autoestima e mostrar o outro lado”, explica. “Se a pessoa não
é boa em algo, certamente será em outra coisa”. Afinal de
contas, a melhor maneira de domar o sentimento da inveja é
identificá-lo e aprender a lidar com ele.
Claudia Jordão e Carina Rabelo. Inveja.
In: Isto É, 3/6/2009 (com adaptações).