Em muitas das teorias econômicas fundamentais, as
pessoas de carne e osso, falíveis e volúveis, não existem.
Essas teorias só funcionam com o “homem estatístico”, o
4 - somatório de agentes econômicos vistos como máquinas de
calcular que administram com rigor seus recursos limitados.
O pai da economia moderna, o escocês Adam Smith (1723-
7 - 1790), enxergava um mundo ordenado em que cada indivíduo
agia sempre no interesse pessoal e da família e, assim,
acabava contribuindo para a prosperidade geral da nação.
10 - Disse Smith: “Não é da benevolência do padeiro, do
açougueiro ou do cervejeiro que eu espero que saia o meu
jantar, mas, sim, do empenho deles em promover o próprio
13 - autointeresse”. Talvez a maioria das pessoas do círculo de
conhecidos de Smith na Edimburgo protestante do século
XVII fosse mesmo seres racionais, donos do próprio destino
16 - e empenhados na promoção de seu autointeresse econômico.
Mas é mais comum encontrar gente que gasta mais do que
ganha e compra aquilo de que não precisa.
19 - A economia comportamental arejou esse pensamento
econômico, dando lugar a modelos mais sensíveis às
vicissitudes da psicologia humana, com suas falhas de
22 - cálculos e percepções enganosas. Talvez seu maior mérito
seja entender que padeiros e cervejeiros criteriosos existem,
são numerosos, mas convivem com multidões para quem a
25 - racionalidade financeira no dia-a-dia é tão estranha quanto o
popular esporte escocês de arremesso de troncos. Kahneman,
Prêmio Nobel de economia em 2002, afirma que padeiros e
28 - cervejeiros nem sempre tomam decisões sóbrias e corretas.
Eles agem de acordo com os misteriosos mecanismos mentais
de aceitação e rejeição de risco. Uma mesma pessoa que só
31 - bebe água mineral e morre de medo de bactérias pode ser
vista fazendo bungee jumping, esporte em que o praticante se
joga de uma ponte sobre um abismo amarrado por uma corda
34 - elástica. No mundo econômico, atitudes incoerentes como
essa são quase a regra.
Veja, ano 42, n.º 2, 2009, p. 68-70 (com adaptações)