Texto CG1A1
A existência de médicas e o que esse fato significaria no
contexto dos séculos V e IV a.C. na Grécia são temas
extremamente controvertidos. A história da primeira obstetra,
Hagnodice, citada pelo autor romano Higino em 150 d.C., é um
mito etiológico óbvio. De acordo com Higino, não havia
obstetras em Atenas, porque as mulheres e as escravas não
podiam aprender a arte da medicina, até que Hagnodice, “uma
aluna de Herófilo”, disfarçou-se de homem. Quando, mais tarde,
foi julgada por seu crime, foi salva pelos protestos das mães
atenienses a quem havia prestado ajuda. Os maridos
apiedaram-se de sua sorte e a lei mudou. As dificuldades
cronológicas, legais e sociais no relato de Higino impedem que
seja considerado um fato histórico. Além disso, era irrelevante o
fato de Hagnodice ter estudado com um professor famoso, em
uma sociedade na qual ajudar nos partos não era uma ocupação
de tempo integral e essas habilidades poderiam ser adquiridas
pela presença, observação e experiência sem necessidade de
estudos específicos. A diferenciação entre uma parteira e um
“médico” era uma questão pessoal, porque não havia leis que
definiam as duas profissões.
Vivian Nutton. A medicina antiga. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 2017, p. 164 (com adaptações).