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1 A distinção entre espetáculo (manifestação legítima da cultura) e simulacro (entretenimento da indústria cultural) tornou-se corrente entre os analistas que se ancoram nos 4 valores modernistas para a compreensão da pós-modernidade. Segundo eles, no campo da produção simbólica e da produção propriamente cultural, a pós-modernidade estaria se 7 manifestando e se definindo pela proliferação abusiva e avassaladora de imagens eletrônicas, de simulacros, e mais e mais estaria privilegiando-os. A distinção entre espetáculo e 10 simulacro é correta e deve ser acatada, pois ajuda a melhor compreender o universo simbólico e cultural dos nossos dias. Como quer Fredric Jameson em Pós-modernidade e 13 sociedade de consumo, o campo da experiência do homem atual se circunscreve às paredes da caverna de Platão: o sujeito pós-moderno já não fita diretamente, com seus próprios olhos, 16 o mundo real à procura do referente, da coisa em si, mas é forçado a buscar as suas imagens mentais do mundo nas paredes do seu confinamento. Para ele, permanece a concepção 19 triádica que temos do signo (significante, significado e referente). No entanto, em lugar de se privilegiar o referente, como acontece nas teorias clássicas e modernistas do realismo, 22 afirma-se a onipresença da imagem, isto é, da cadeia significante. A realidade (se não for abusivo o uso desse conceito neste contexto) se dá a ver mais e mais em 25 representações de representações, como querem ainda os teóricos da pós-modernidade. A distinção entre espetáculo e simulacro é correta; no 28 entanto, em mãos de teóricos modernos, traz em si uma estratégia de avaliação negativa da pós-modernidade, muitas vezes pouco discreta. Ela visa privilegiar o reino da 31 experiência viva, in corpore, e desclassificar a experiência pela imagem, in absentia. Visa também classificar o espetáculo (que se dá em museus, salas de teatro, de concerto etc.) como 34 forma autêntica de cultura e desclassificar o simulacro (que se dá sobretudo pelo cinema ou vídeo e pela televisão) como arremedo bastardo produzido pela indústria cultural. O 37 primeiro leva à reflexão e o outro serve para matar o tempo. Visa ainda e finalmente a qualificar os meios de comunicação de massa como os principais responsáveis pelo aviltamento da 40 vida pública. Para os idealizadores da distinção e defensores do espetáculo está em jogo preservar a todo custo, numa sociedade que se quer democrática, a possibilidade de uma 43 opinião pública, e esta só pode se dar plena em uma crítica avassaladora dos meios de comunicação de massa, que divulgam à exaustão imagens e mais imagens simulacros — 46 para o consumo indigesto das massas. Nos países avançados, o jogo entre espetáculo e simulacro, se não tem como vencedor o espetáculo, termina 49 certamente pelo empate. Bibliotecas, museus, salas de teatro, de concerto, competem — e mais importante: convivem —, com as salas de cinema, as locadoras de vídeo e a televisão. 52 Existe público pagante para o espetáculo caríssimo da encenação de uma grande ópera em Berlim, Paris ou Nova Iorque, e existe um grande público não privilegiado 55 (economicamente, geograficamente, culturalmente etc.) para a retransmissão pela TV desse espetáculo ou de outros. Certos “espetáculos” já nem existem como tal, já surgem como 58 simulacros, isto é, produzidos só para a transmissão eletrônica.59 No Brasil, a disputa entre espetáculo e simulacro, entre modernidade cultural e sociedade de massa, já tem a sua história. Começa e passa pela discussão em torno do consumo 62 extremamente restrito do produto literário — o livro — pelo mercado brasileiro. Antonio Candido, em ensaio de 1973, publicado em plena ditadura militar e em época de 65 alfabetização pelo Mobral, discutia a relação entre literatura e subdesenvolvimento e chamava a atenção para o fato de que, nos países latino-americanos, criava-se uma “condição 68 negativa prévia” para a fruição de obras literárias — essa condição era o número restrito de alfabetizados. O escritor moderno, da periferia subdesenvolvida, estava fadado a ser 71 “um produtor para minorias”, já que as grandes massas estavam “mergulhadas numa etapa folclórica de comunicação oral”. Entre parênteses, lembre-se de que, para os pensadores 74 do iluminismo, o acesso à obra de arte e a subsequente fruição dela significavam um estágio superior no processo de emancipação do indivíduo.
Silviano Santiago. Intensidades discursivas. In: O cosmopolitismo do pobre. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2004, p. 125-7 (com adaptações).
Com relação às ideias desenvolvidas no texto anterior, julgue (C ou E) os item subsequente.
Com relação aos sentidos e ao emprego de palavras e expressões no texto de Silviano Santiago, julgue (C ou E) o item seguinte.
A expressão “concepção triádica” (linhas 18 e 19), extratextualmente, poderia também ser utilizada para representar a Santíssima Trindade, doutrina acolhida pela maioria das igrejas cristãs.