Naquele tempo eu morava no Calango-Frito e não acreditava em feiticeiros.
E o contrassenso mais avultava, porque, já então, - e excluída quanta coisa-e-sousa de nós todos lá, e outras cismas corriqueiras tais: sal derramado; padre viajando com a gente no trem; não falar em raio: quando muito, e se o tempo está bom, “faísca”; nem dizer lepra; só o “mal”; passo de entrada com o pé esquerdo; ave do pescoço pelado; risada renga de suindara; cachorro, bode e galo, pretos; [...] - porque, já então, como ia dizendo, eu poderia confessar, num recenseio aproximado: doze tabus de não uso próprio; oito regrinhas ortodoxas preventivas; vinte péssimos presságios; dezesseis casos de batida obrigatória na madeira; dez outros exigindo a figa digital napolitana, mas da legítima, ocultando bem a cabeça do polegar; e cinco ou seis indicações de ritual mais complicado; total: setenta e dois - noves fora, nada.
ROSA, J. G. São Marcos. Sagarana. Rio de Janeiro: José Olympio, 1967 (adaptado).
João Guimarães Rosa, nesse fragmento de conto, resgata a cultura popular ao registrar