Língua Portuguesa
A história de sucesso das nações hoje desenvolvidas
possui um traço comum e inequívoco: a ascensão política e
econômica da classe média. Essa evolução foi primeiro
observada na Europa, onde sociedades estratificadas e sem
mobilidade deram lugar a países dinâmicos após a irrupção do
capitalismo. Esse fenômeno chegou tardiamente ao Brasil e
nunca fincou raízes sólidas e duradouras. Houve fases de
rápido crescimento, como na industrialização do início do século
passado ou no milagre econômico dos anos 70. Mais
recentemente, o país chegou a vislumbrar um salto rumo ao
desenvolvimento com o Plano Cruzado. Mas, em todos esses
casos, o aumento no padrão de vida dos mais pobres foi
transitório e abortado pouco depois por crises econômicas.
Agora, com a retomada do crescimento econômico, o país volta
a se ver diante da oportunidade de romper de maneira definitiva
com o subdesenvolvimento. Nos dois últimos anos, mais de 20
milhões de brasileiros saíram das camadas sociais mais baixas
– as chamadas classes D e E − e alcançaram a classe C, porta
de entrada para a sociedade de consumo.
As conclusões acima fazem parte de um estudo feito em
2008. Trata-se da mais recente evidência de que o país tem
conseguido, enfim, reduzir sua população de miseráveis, ao
mesmo tempo em que começa a formar uma sociedade de
consumo de massa. Outras pesquisas e estudos, com
metodologias distintas, já haviam detectado esse avanço, que
nada mais é senão a recompensa ao ciclo de reformas e ajustes
econômicos feitos pelo país desde o Plano Real, sobretudo o
combate à inflação. Comparado ao meio bilhão de novos
consumidores que China e Índia produziram na última década, o
fenômeno brasileiro pode não impressionar. Mas é notável. O
resultado disso é que, em um fato inédito na história recente, a
classe C é hoje o estrato social mais numeroso do país.
É sempre uma boa notícia a ascensão econômica de
pessoas, especialmente a caminho da classe média, notório
colchão social entre os estratos mais ricos e mais pobres, capaz
de reduzir as tensões sociais. Se a emergência da classe C é
um processo sustentável, só o tempo dirá. O que se pode
atestar com certeza é que essa transformação deu novo ânimo
à economia, despertando o surgimento de negócios, criando
empregos e aproximando o Brasil de uma verdadeira economia
de mercado. Diz o filósofo Roberto Romano, da Unicamp: "Um
país em que a classe média diminua está fadado à estagnação
social e econômica. O desafio agora será integrar essa massa
populacional à produção de bens e serviços mais elaborados,
com investimento em educação técnica, para que esse
fenômeno não seja passageiro."
(Adaptado de Julia Duailibi e Cíntia Borsato. Veja, 2 de abril
de 2008, p. 84-86)